Política

Postado dia 05/08/2022 às 14:40:32

Estagiárias fazem TRE-PR bombar no TikTok e incentivam jovens a votar

Quando o desembargador Wellington Emanuel Coimbra de Moura, 60, tomou posse como presidente do TRE-PR (Tribunal Regional Eleitoral do Paraná), em fevereiro, ele imaginava o tamanho da tarefa que teria pela frente. Em tempos de fake news e de ataques às urnas eletrônicas, conduzir uma eleição num estado que ajudou a eleger Jair Bolsonaro (PL) seria uma "missão desafiadora", nas suas palavras.

Até convencer os jovens a exercer seu direito de votar tinha virado um problema. No Paraná, cerca de 310 mil brasileiros de 16 e 17 anos estavam aptos a votar em 2020, mas só 36 mil (menos de 12% do total) tinham tirado o título de eleitor. O número incomodava o desembargador.

À época de sua posse, faltavam pouco mais de dois meses para o encerramento do prazo para cadastramento de eleitores para o pleito deste ano. O TRE-PR estava em campanha em suas redes sociais para incentivar jovens a votar — e as postagens do tribunal no TikTok já viralizavam na internet.

Até ali, ele mal conhecia a rede social, criada em 2016 por uma empresa chinesa e que hoje já tem mais de 1 bilhão de usuários no mundo todo. Mas Coimbra de Moura viu que ela dava resultado — o número de jovens eleitores no Paraná chegou a 120 mil em 2022. Resolveu então "bombar" o perfil do TRE-PR: decidiu que ele mesmo passaria a fazer dancinhas e esquetes em busca de likes e engajamento.

Em abril, Coimbra de Moura fez um vídeo tranquilizando eleitores preocupados com a falta de respostas de requerimentos à Justiça Eleitoral. Em maio, esteva num vídeo acompanhado de jovens comemorando o crescimento da participação deles nesta eleição. Em junho, já estava fazendo coreografia famosa graças ao TikTok — só este post teve quase 600 mil views; ao todo, os vídeos do perfil ultrapassam 2 milhões de likes.

As estagiárias Ana e Marianna, ao lado de Beatriz Artigas, 21, gerente de redes sociais do TRE-PR

Meninas de ouro

"A ideia surgiu naturalmente", conta. Luzia Nadja Guimarães, presidente do TRE-PA (Tribunal Regional Eleitoral do Pará), foi visitá-los e pediu para gravarem um vídeo para dialogar com a juventude. "Fomos ao estúdio e gravamos." No vídeo, os desembargadores aparecem ao lado da estagiária do TRE-PR, Marianna Croce, 19, e da gerente de redes sociais do tribunal, Beatriz Artigas, 21.

Marianna, Beatriz e a estagiária Ana Luiza Thomazini, 23, vasculham a internet em busca da coreografia do momento ou do áudio mais dublado por influenciadores. Adaptam as trends à agenda institucional de divulgação do TRE-PR, criam os posts que misturam "acorda, Pedrinho" com combate a fake news. E, sempre que dá, incluem Coimbra de Moura nas postagens porque ele "dá visualização".

"Ele gosta de participar. E a galera curte", diz Marianna. "Acho que esse jeitinho dele meio fofinho chama a atenção", completa, ressaltando o estilo "bom velhinho" do magistrado.

O TikTok do TRE-PR tem mais de 17 milhões de visualizações e quase 73 mil seguidores, recorde entre os órgãos públicos brasileiros — o STF (Supremo Tribunal Federal), por exemplo, tem cerca de 45 mil seguidores.

Consideradas "meninas de ouro" pelo desembargador, as funcionárias ganharam uma sala própria há dois meses, no andar acima do estúdio de gravação do tribunal. A sala não é grande, mas tem uma porta de vidro que dá vista para o centro de Curitiba — não são todos que têm essa vista no tribunal.

Lá, elas organizam uma rotina rígida para manter o perfil da casa no TikTok. Todo dia tem de ter post novo. Todo dia alguém tem de responder comentários.

Marianna e Ana se revezam nas tarefas, um dia uma grava e a outra responde. Beatriz palpita e tenta garantir que os temas de interesse do TRE-PR estejam contemplados em cada post. Faz também o "meio de campo" com a comunicação institucional do tribunal para evitar que as músicas e as coreografias passem do tom aceitável para uma corte eleitoral. "Cadelinha de bunda pra cima não dá, né?", diz.

Consideradas 'meninas de ouro' pelo desembargador, as funcionárias ganharam uma sala própria há 2 meses.

Para evitar deslizes, todo post só vai ao ar depois de ser discutido num grupo de WhatsApp com três dos assessores mais experientes do TRE-PR. Todos precisam dar o "ok" antes da publicação. No grupo também é discutida a repercussão das postagens. Entre magistrados do tribunal, ela nem sempre é boa.

"Tem uma certa resistência. É natural", explica Beatriz. "A Justiça é um ambiente formal, rígido. Não são todos que gostam dessa forma de comunicação. Às vezes, no grupo, chegam mensagens encaminhadas. Aí a gente dá uma maneirada."

Maneirada, inclusive, nas roupas de gravação. Visual despojado, unha pintada de cores neon e maquiagem são bem-vindos. Decote e barriga de fora devem ser evitados. A recomendação vale até para a preservação das tiktokers. Isso porque, no TikTok do TRE-PR, a pergunta mais frequente dos seguidores é: "qual a @ das estagiárias?"

Visual despojado, unha pintada de neon e maquiagem são bem-vindos; decote e barriga de fora, não

Pisando em ovos

Outro cuidado: que nenhum político ou partido seja favorecido ou se sinta prejudicado com os posts. Polegar e indicador levantados numa dancinha, por exemplo, podem ser vistos como a letra "L" de Luiz Inácio Lula da Silva (PT); se o polegar estiver no alto e o indicador apontar para a frente, isso pode ser visto com uma arminha de Bolsonaro (PL) — nesses casos, é melhor evitar.

Também é bom evitar ironias mais ácidas a respeito de propostas de contagem manual de votos, por exemplo. Um post sobre esse tema, aliás, já teve de ser excluído do perfil do TRE-PR após críticas de apoiadores da deputada federal Bia Kicis (PL).

Bolsonarista, Kicis é autora da PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que propôs a obrigatoriedade da impressão dos votos registrados em urnas eletrônicas. A proposta acabou arquivada por decisão do plenário da Câmara dos Deputados em agosto passado.

Na época, o TRE-PR postou um vídeo ironizando quem defendia a impressão. Recebeu uma enxurrada de reclamações de eleitores de Kicis e do próprio Bolsonaro. Para encerrar a questão, o tribunal resolveu excluir o post.

"Dependendo do assunto, você acaba despertando uma massa que vem para atacar a Justiça Eleitoral mesmo. Aí não vale a pena responder", diz Ana. "Assédio e ataques a gente ignora. Quando passa do limite, a gente bloqueia."

Os casos de bloqueio, porém, são raros. Os problemas são infinitamente menores que as soluções, na visão do desembargador.. Por isso, o TikTok do TRE-PR segue ativo e cada vez mais seguido.

Em julho, ele lançou um concurso para que um jovem possa conhecer a rotina do presidente do TRE-PR. O concurso foi suspenso devido à proximidade do pleito de outubro. A intenção do tribunal, porém, é que estudantes se interessem cada vez mais pelo trabalho da corte.

É justamente com eles que o TRE-PR quer falar no TikTok, segundo Beatriz. A gerente diz que eles ou futuros eleitores não estão sequer acostumados a entrar num site de um órgão público em busca de informações e, nesse caso, a rede social cumpre um papel que outras ferramentas não conseguem cumprir.

"Estamos falando com gente de 13 a 20 e poucos anos. Se eles têm uma dúvida, eles digitam a pergunta no Google e clicam no primeiro atalho", explica. "Para eles, dancinha e coreografia chamam a atenção. Se visualizou, entregamos nossa mensagem."

Para ela — e para o desembargador —, é gratificante saber que o trabalho é efetivo. Beatriz conta que, durante a campanha para incentivo à solicitação de título de eleitores, jovens do Amazonas usaram o TikTok do TRE-PR para tirar dúvidas e enviaram mensagens dizendo que as informações fornecidas os incentivaram a tirar o título.

Na salinha das tiktokers do tribunal, há um calendário marcado com assuntos sobre várias postagens que deverão ser publicadas nas eleições. No que depender delas e de Coimbra de Moura, não vão faltar dancinhas e dublagens até o final de outubro.

"Nossa mensagem tem sido entendida", diz o desembargador tiktoker. "Buscamos por essa aproximação e acredito que estamos colhendo bons resultados."


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